sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Oração para quem não teme...


Fabrício Carpinejar, poeta e jornalista

Encantos

Encantos
tantos
que nem todos os quebrantos
tiram a magia
de ser um dia
a soberana
dona de todas as horas
que baila, etérea
sobre os ponteiros
do tempo.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Minha avó


Mulher de pouco estudo
mas imensa sabedoria
minha avó construía mundos
tecidos em linha e magia
Vestia princesas, cavaleiros,
camas, mesas e janelas
Minha avó tinha nas mãos
o dom da delicadeza.
Tecia com muita destreza
mundos de tanta beleza
que eu, ainda menina,
sentada aos pés da cadeira
imaginava enxergar,
na ponta de sua agulha
fagulhas da luz divina
moldando cores e linhas
botões, bordados, crochês...

Ah, minha avó, quem me dera
metade de seu encanto...
essas mãos que tateiam teclas
não sabem prender a beleza
em vestes feitas pra sonhar...

Fechar os olhos e pular...


Cega
me jogo de cabeça
no abismo dos teus braços.
Confio plenamente
nas sensações
e sorrio
- mulher de coração infantil –
ante a doce leveza
de nunca mais precisar enxergar.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Serenidade...


Menina de olhos que sonham
eu quis muitos momentos
que nunca existiram.
Imaginei muitas melodias
que não consegui desenhar.
Apanhada em pleno sonho
não me traí:
Acusada injustamente
ergo a cabeça
e serenamente caminho
para o cadafalso.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Resistência

Não adianta fugir

o cheiro do meu corpo
vai te seguir
em todo lugar
até que desistas
dessa resistência
e te jogues

- capitão de naus imaginárias –

no mar de sensações
que anseias viver em mim.

domingo, 26 de outubro de 2008

Melhor acordar...


Me enrosco no travesseiro como se pudesse abraçar-te além do sonho. Além dos medos todos que trazemos em nós. Além dos desencontros comuns nas vidas que não têm espaço. Abraço o travesseiro e te conto minhas fantasias. Sorris com ironia, a vida é tão curta! Te cutuco, brincando, te chateias comigo. Não temo o que não vejo. Não pressinto, não te falo dos meus dias que só tenho pensado em como te puxar pra mais perto e mais nada. Não te digo nada. Fecho os olhos, sonolenta e reclamo dos teus bocejos. A noite acabou. A luz que não é minha me ofusca. Travesseiro nenhum tem o teu cheiro. Melhor acordar.

sábado, 25 de outubro de 2008

Bruna Lombardi


Mais conhecida por seus trabalhos na televisão que por sua obra poética, Bruna Lombardi tem um estilo intenso e vibrante. Escreveu 3 livros de poesias: "No ritmo dessa festa", em 1976, "Gaia", em 1980 e "O Perigo do Dragão", em 1984 . A poesia "Alta Tensão", que eu posto abaixo, tem sido muitas vezes atribuída à Clarice Lispector, mas foi escrita por Bruna, e está no livro "O Perigo do Dragão".


Alta Tensão

Eu gosto dos venenos mais lentos
dos cafés mais amargos
das bebidas mais fortes
e tenho
apetites vorazes
uns rapazes
que vejo
passar
eu sonho
os delírios mais soltos
e os gestos mais loucos
que há
e sinto
uns desejos vulgares
navegar por uns mares
de lá
você pode me empurrar pro precipício
não me importo com isso
eu adoro voar.

Bruna Lombardi


No site Bruníssima você encontra vários trechos de sua obra, que inclui ainda alguns romances. O último publicado, "Meu ódio será tua herança", foi publicado pela Guanabara Koogan em 2004.

Hai-kai


Procuro as palavras certas.
Elas não se escondem.
Elas não existem.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Sossego

Te esperei tanto
que quando chegaste
já estava confortável
em minha solidão
e não havia mais espaço
pra nós dois.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Fim do baile


Esqueci de trocar a fantasia
entrei na festa errada
e não percebi que me alegrava à toa.

Mãe de muitos amores
me deixei iludir pelo brilho incomum
das lantejoulas douradas
bordadas em minha máscara.

Fingi que era bela
e dancei
exorcizando dores e criando alegorias

até ser expulsa do salão.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Música que me embala esta tarde

Cheguei em Macapá em 1997, estranhando tudo, querendo desesperadamente voltar pra casa. Mas não dava. Fui ficando. E agradeço a Deus, todos os dias, por não ter me permitido ir embora quando meu coração ainda tinha raízes em outras terras. Agora, depois de muito bolo com café na porta da casa de D. Alegria, meu endereço é este, às margens do Rio Amazonas. Aqui, onde replantei minhas raízes e colho os frutos de minha persistência. Hoje, mais amapaense que muita gente que nasceu aqui, embalo minha tarde ao som do Zé Miguel.



Meu endereço
(Fernando Canto/Zé Miguel)

Meu endereço é bem fácil
é ali no meio do mundo
onde está meu coração
meus livros, meu violão
meu alimento fecundo

A casa por onde paro
qualquer carteiro conhece
é feita de sonho e linha
que brilha quando anoitece

Na minha casa se tece
mesura na luz do dia
pra afugentar quebranto
na hora da fantasia

É fácil o meu endereço
vá lá quando o sol se pôr
na esquina do rio mais belo
com a linha do equador.

Caminhos

Relutante,
caminho
em terra firme.

Do barco que deixei no cais
trago o cheiro do infinito.

Não temo.
Duvido de tudo

mas tudo é tão bonito!

Iluminada

Não posso ignorar
mesmo com tantas nuvens
o brilho que enfeita meu rosto.

O espelho não me sorri
- não importa

Luzes de todas as estrelas
iluminam meu caminho.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Poeminha

Escondida
de mim mesma
coração
amarrotado
vou tentando
não pensar
porque
pensar é complicado...

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Mário Quintana

Passeando pelo blog da Alcinéia Cavalcante, vi um post de uma frase do Mário Quintana, e bateu uma saudade de ler aquelas palavras leves do poeta que muitas vezes acompanhou meus conflitos adolescentes (na adolescência a termo, não nessa agora - totalmente fora de hora - em que me encontro).
Mário Quintana, para quem não sabe, tentou três vezes uma vaga na Academia Brasileira de Letras, mas em nenhuma das ocasiões foi eleito. Ao ser convidado a candidatar-se uma quarta vez, e mesmo com a promessa de unanimidade em torno de seu nome, o poeta recusou, e escreveu seu conhecido Poeminha do contra:
Todos esses que aí estão
Atravancando meu caminho
Eles passarão...
Eu passarinho!
Dele também é um poema singelo e muito bonito sobre a tristeza:
Eu Escrevi um Poema Triste

Eu escrevi um poema triste
E belo, apenas da sua tristeza.
Não vem de ti essa tristeza
Mas das mudanças do Tempo,
Que ora nos traz esperanças
Ora nos dá incerteza...
Nem importa, ao velho Tempo,
Que sejas fiel ou infiel...
Eu fico, junto à correnteza,
Olhando as horas tão breves...
E das cartas que me escreves
Faço barcos de papel!
Desse jeito, ficar triste parece leve, um exercício de abstrair-se e deixar-se ir, sem brigar contra os acontecimentos... Lindo...

domingo, 19 de outubro de 2008

Para os dias mais escuros












Não deixe que a escuridão
engula seu ímpeto
dite seu rumo
feche seus caminhos
Não deixe que a ausência de luz
escureça também sua alma
sofrida e magoada
(tantas cicatrizes que desisti de contar)
Deixe que minha alegria
de menina que não quer crescer
entre por suas pupilas
e te abrace
(criança que cresceu cedo
e esqueceu da felicidade
em algum lugar
e agora não lembra mais
onde deixou...)

sábado, 18 de outubro de 2008

Palavras que o vento trouxe...


Não há machado que corte
a raiz ao pensamento
não há morte para o vento
não há morte

Se ao morrer o coração
morresse a luz que lhe é querida
sem razão seria a vida
sem razão

Nada apaga a luz que vive
num amor num pensamento
porque é livre como o vento
porque é livre

Palavras para refletir

dunas

sou um
grão de areia
nas dunas
do deserto

o vento
sopra forte
e o meu destino
é incerto

nem há
como saber
se estou longe
ou se estou perto

Edimo Ginot

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Reencontros

Todo reencontro é uma história que estava guardada que sai pra tomar um ar. Sai porque é bom reviver tudo o que marcou, como reler um livro que lemos quando éramos crianças. Cheio de sensações boas, lembranças que se misturam às palavras que lemos com outros olhos. Olhos de quem já passou por tudo, e sabe o final da novela. Mas que mesmo sabendo o que vai acontecer à mocinha ainda sente o gosto pelo desenrolar da trama.
Reencontros são novos capítulos de uma história que parecia ter chegado ao fim, mas que podia estar só pausada, esperando alguém apertar na tecla certa pra reiniciar a gravação. E têm gosto de passado, aquele passado bom, que gostamos de ver nos álbuns de fotografias. Aquele passado que tem cheiro e sabor, como pudim ainda morno na cozinha de nossas avós.
É curioso como alguns caminhos se separam para se encontrarem novamente mais adiante, cheios de vida, cor, luzes. As encruzilhadas que nos afastam também nos indicam novas formas de encontrar a felicidade. Porque a felicidade que enxergamos no outro não nos pertence, precisamos buscar nosso próprio brilho. Para então, conscientes de nossos contornos e recheios, sermos capazes de entregarmo-nos, inteiros, absolutos, a quem quer que mereça nossa entrega. Sabedores que o brilho que vemos no outro é nada mais que reflexo de nosso próprio refulgir.
Histórias que se repetem, gestos cheios de significados, palavras que tatuamos na alma. Reencontros são oportunidades que a vida nos dá para abraçarmos nossas lembranças mais preciosas antes de adormecermos. E valem por anos de espera. Porque alguns reencontros, mágicos, encantados, entrelaçam-se às nossas horas para o resto da vida, tornando o tempo que nos resta um poema colorido e perfumado. E nos brindam com a esperança de dias mais felizes. Com nuvens de chuva e gosto de quero mais.

Para não ficar esperando...


Antes que seja tarde
Ivan Lins / Vitor Martins

Com força e com vontade
A felicidade há de se espalhar
Com toda intensidade
Há de molhar o seco
De enxugar os olhos
De iluminar os becos
Antes que seja tarde
Há de assaltar os bares
E retomar as ruas
E visitar os lares
Antes que seja tarde
Há de rasgar as trevas
E abençoar o dia
E de guardar as pedras
Antes que seja tarde
Há de deixar sementes
No mais bendito fruto
Na terra e no ventre
Antes que seja tarde
Há de fazer alarde
E libertar os sonhos
Da nossa mocidade
Antes que seja tarde
Há de mudar os homens
Antes que a chama apague
Antes que a fé se acabe
Antes que seja tarde.

Porque esperar pela felicidade é cansativo e muitas vezes não nos leva a ela. Ser feliz é por conta de cada um de nós. Com força e com vontade. Pense nisso.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Feliz dia do professor!

Ensinar
é um exercício
de imortalidade.
De alguma forma
continuamos a viver
naqueles cujos olhos
aprenderam a ver o mundo
pela magia da nossa palavra.
O professor, assim, não morre
jamais...

Rubem Alves

domingo, 12 de outubro de 2008

Alegria de criança

Alegria da criança
que mora em mim:

chuva forte,
vento frio
abraço quente
cheiro de café torrando
perfume de bolo assando
voz da mãe chamando
Amor que não acaba mais...

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Medo dentro de mim...


Nunca mais dormirei pensando em ti. Porque as nuvens invadem meu quarto com as sombras ressaltadas pela luz da lua. O teu nome entra em meus pensamentos como o relincho surdo de uma égua no cio. Um pensamento de laranja azeda e sorvete de milho verde dentro de mim. E as nuvens! Reflexos negros dentro do meu quarto como se estivessem dentro do meu peito, me sufocando! O relógio parou. Lá fora, luzes vão apagando nas janelas dos apartamentos vizinhos e o tempo vai escoando lentamente, como uma bailarina que não quer terminar seu número porque não tem para onde ir depois que descer do palco. Tua sombra continua nadando em mim, na minha saliva, esperando o dia amanhecer. Quero dar um grito, mas estou oca, completamente despida de energia. Buzina um carro na rua paralela ao edifício onde me escondo da noite. Tremo de frio, arrepiando os pelos das coxas. Tua imagem, destituída de forma exata, volta a me perturbar como um tiroteio cortando o silêncio, essas armas que nunca calam! Sinto falta do murmúrio do vento balançando as folhas dos açaizeiros que avisto da minha janela. A escuridão parece ter apagado as estrelas. Não, as estrelas não quiseram brilhar hoje. E jamais aparecerão de novo enquanto eu pensar em ti. Resta-me a pálida luz da lua, que aumenta meu medo das sombras que ela ressalta. E as nuvens não vão embora. Por isso sinto medo. Nunca mais dormirei pensando em ti. Não dormirei nunca mais.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Karl Marx


Dos manuscritos econômico-filosóficos de Karl Marx (e que eu trouxe comigo durante anos, numa camiseta azul...):

"Suponhamos que o homem seja homem
e que sua relação com o mundo seja humana.
Então, o amor só pode ser trocado por amor,
confiança, por confiança."

Pois é... Ele falou e eu assino embaixo!

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Músicas para limpar os ouvidos...

Estou cansada das mesmas músicas tocando nas FMs. Meus ouvidos pedem trégua, e eu de bom grado concedo. Selecionei algumas faixas para escutar quando quero simplesmente ouvir boa música. Espero que você também goste:

1. Meu endereço - Zé Miguel
2. Tá Perdoado - Maria Rita
3. Vieste - Ivan Lins
4. Vai Levando - Chico Buarque
5. Encontros e Despedidas - Milton Nascimento
6. Tá Combinado - Maria Bethânia
7. Não me arrependo - Caetano Veloso
8. Carta ao Tom - Toquinho e Vinícius

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Tem bolo!

O blog Idéias de Jeca-tatu, do professor universitário Ivan Carlo de Oliveira, completa nesse dia 8 de outubro cinco anos de existência. O Idéias foi, provavelmente, o primeiro blog amapaense a falar de temas como histórias em quadrinhos ou marketing.
Nesses cinco anos o blog já ganhou prêmios, como o destaque do Weblogger e já foi linkado por sites e blogs das mais diversas regiões do Brasil e do mundo.
Pra comemorar, o site está republicando os textos mais antigos. Vale a pena dar uma conferida!
Para o amigo Ivan, que é um dos melhores redatores de quadrinhos do Brasil, além de blogueiro de mão-cheia, meus desejos de muito sucesso!
Em tempo: o nome do blog é uma referência ao livro Idéias de Jeca Tatu, de Monteiro Lobato, no qual ele apresentava suas idéias sobre estética e literatura.

Cecília Meireles

Ainda que tenha vivido há mais de 100 anos, as palavras que Cecília Meireles registrou acabaram por eternizar-se, sempre atuais, sempre belas.
Sua poesia foi traduzida para o espanhol, francês, italiano, inglês, alemão, húngaro, hindu e urdu, e musicada por Alceu Bocchino, Luis Cosme, Letícia Figueiredo, Ênio Freitas, Camargo Guarnieri, Francisco Mingnone, Lamartine Babo, Bacharat, Norman Frazer, Ernest Widma e Fagner.

É preciso não esquecer nada

É preciso não esquecer nada:

nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes
nem a oração de cada instante.
É preciso não esquecer de ver a nova borboleta
nem o céu de sempre.
O que é preciso é esquecer o nosso rosto,
o nosso nome, o som da nossa voz, o ritmo do nosso pulso.
O que é preciso esquecer é o dia carregado de atos,
a idéia de recompensa e de glória.
O que é preciso é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos
severos conosco, pois o resto não nos pertence.


Cecília Meireles

sábado, 4 de outubro de 2008

Absoluta

Absoluta

como tudo o que não permite
espaço pra coisa nenhuma
que não seja a visão
do meu corpo
e o som
da minha voz
na tua vida.


Absoluta
e não discuta.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Nem tudo se explica

Quero prender o instante

em minhas pupilas miúdas

e devorar cada palavra

antes de pular de cabeça.


Entender,

não ouso.
website counter
Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons.